23 de Março de 2023
Mortos e vivos amarrados
Pe. Miguel Ramon
No Capítulo 11 do Evangelho de João, encontramos uma passagem interessante e bem conhecida onde Jesus é confrontado com a morte do seu amigo Lázaro. Nesta narrativa, Jesus é apresentado com um aspecto muito humano que se manifesta nas lágrimas que ele derrama por causa do falecimento de uma pessoa amada. Como todo ser humano que perde um ente querido, ele sente dor e tristeza pelo amigo que se foi e chora. Se apressa para estar ao lado dos familiares que sofrem e vivem enlutados. Quer logo se aproximar e levar consolo. É uma característica de toda a vida de Jesus estar próximo dos sofredores. Ao escrever este episódio, João quer nos revelar também que na presença de Jesus não devemos perder nunca a esperança, mesmo diante de situações muito difíceis e até diante da própria morte.
Mas o que quero colocar para nossa reflexão aqui é que Jesus manda tirar as amarras que deixam Lázaro preso, sem possibilidades de se mover e de sair do túmulo da morte. Eis aí uma das grandes tarefas que Jesus confia aos seus discípulos. Aos que tinha dito: “Dai-lhes vós mesmos de comer”, para acabar com a fome das multidões que o seguiam, agora ele ordena: “Desamarrem e deixem que ele ande”. Nos sinais que Jesus realiza, ele convida os discípulos a cooperar. A partilha do pão, feita com a distribuição pelos Apóstolos, permite que todos comam e ainda haja sobras. Jesus tira Lázaro do túmulo e o faz reviver, mas pede a colaboração dos discípulos para realizar a libertação total de tudo que é um empecilho para que o morto ande. Desamarrar as amarras permite que a pessoa possa sair por completo do túmulo e viver plenamente. Na própria participação, nos sinais que Jesus realiza, os discípulos fazem como que uma experiência antecipada da própria missão. Vou ser testemunha da Boa Nova partilhando o pão e desamarrando as amarras. É assim que somos convidados a acabar com tudo que impede as pessoas a viverem com dignidade, marcadas até para morrer por assassinatos, por violência, por falta de cuidados médicos ou por falta de alimentos suficientes e saudáveis. Muitas vezes as pessoas carregam pesados fardos nas costas, ficam imobilizadas e não conseguem se deslocar para buscar uma vida melhor. Há muita vida paralisada por falta de acolhida fraterna, de solidariedade e de motivos para viver. São inúmeros vivos que passam seus dias como se estivessem enterrados em um túmulo. “Eu vim para que todos tenham vida e a tenham em plenitude”, disse Jesus.
São tantas amarras que somos chamadas a tirar das costas dos que ficam presos nelas para que possam andar livremente e viver novamente com alegria e esperança. Desamarrando vamos substituir o mal cheiro da morte pelo aroma da vida bem vivida.