24 de Janeiro de 2023
Narrativas natalinas (5)
Pe. Miguel Ramon
Após ter apresentado as narrativas consumistas, folclórico-culturais, religiosas e humanísticas de Natal, terminamos com a narrativa de Jesus encarnado. Encontramos aqui o verdadeiro sentido do Natal. É o grande mistério da fé que Deus torna-se humano. Devia causar um verdadeiro choque perceber que, Deus não permanece distante ou alheio à condição da natureza humana. Ele mesmo a assume. Ele se torna carne humana. É num bebê frágil e carente de afeto, estendendo os bracinhos para ser acolhido, que Ele se revela na plenitude do seu Ser Amor.
O menino Jesus não nasce num palácio. Ele não está nos aposentos de imperador romano ou do Rei Herodes. Não tem um berço de ouro e não dispõe de um exército de escravas que o cercam para oferecer todos os cuidados possíveis. Com ele começa uma nova história, não a partir dos poderosos do seu tempo, mas a partir dos pobres. O filho de Deus nasce pobre, como alguém que não é acolhido na cidade, na presença apenas dos pais migrantes, eles mesmos pobres, submetidos às ordens dos governantes para se inscrever na lista dos que devem pagar impostos. Os primeiros que o visitam são pastores, também eles banidos da cidade e malvistos, especialmente pelos grandes proprietários que veem suas terras às vezes invadidas pelas ovelhas. Tudo ao redor do menino reflete pobreza e simplicidade. Jesus nasce pobre, viverá pobre e morrerá pobre e despojado até do mínimo de dignidade humana.
Celebrar o Natal, portanto, sempre significa estar atento à pobreza divina que enaltece a verdadeira grandeza humana. Esta se revela não na riqueza dos bens que alguém possa possuir, mas na nudez indigente que precisa do afeto e do calor humano dos outros. Celebrar Natal não é apenas contemplar e tocar no menino Jesus, representado nas imagens de madeira, gesso, pano e outros materiais, é antes de tudo tocá-lo na sua carne humana nas crianças que hoje nascem pobres, nas pessoas marginalizadas, nos moradores de rua, nos idosos abandonados, em todos que tem sua humanidade ferida e diminuída.
O nascimento do menino-Deus é mais do que um acontecimento do passado. Natal não é somente a celebração de um aniversário, é um renascimento de Jesus no coração daqueles que professam sua fé nele e no caminho de vida que ele propõe. É deixar Jesus tomar corpo em nós, permitir que ele se torne carne da nossa carne. É deixar que, pelo seu Espírito, ele conduza nossa maneira de ser e de agir, como ele estando próximo dos pequenos, pobres, sofredores, esquecidos, excluídos e marginalizados da sociedade. “O que fizestes a um destes pequeninos é a mim que o fizeste” Na realidade Jesus nasce sempre de novo nos pequeninos e é neles que tocamos a sua carne.